O maior dos retrocessos: a possível volta do mata-mata. E você? O que prefere?


Quem imaginava que o 7 a 1 da Alemanha ajudaria de alguma forma o futebol brasileiro a encontrar seu rumo, pode tirar o cavalo da chuva de vez. O calendário pouco mudou, a seleção vai continuar a tirar jogadores de seu time em momentos decisivos e o estaduais ainda têm espaço. Para completar o circo, a pior das ideias possíveis: a volta do famigerado mata-mata ao Campeonato Brasileiro. Uma comissão, criada pela CBF, debate o assunto. Ainda não foi batido o martelo e não deve ser neste ano. Pode ser no próximo, mesmo com as Olimpíadas no meio do caminho, como em 2017, como também chegou a ser ventilado.

Na minha opinião, maior retrocesso não há. Uma comissão, criada pela CBF (o que já causa um certo pé atrás), estuda a questão e pode sugerir formatos de disputa. Segundo matéria do jornal O Globo, a comissão tem representantes de Vasco, Grêmio, Flamengo, Santos, Atlético-PR e Coritiba. Desses, Santos (2004) e Flamengo (2009) venceram o Brasileirão de pontos corridos, mas há um bom tempo não fazem boas campanhas. O Vasco, novamente nas mãos de Eurico Miranda, caiu duas vezes, mesma quantidade do Coritiba, enquanto Grêmio e Atlético-PR caíram uma vez cada.
 
Nada contra existir o debate e que cada um coloque o que for importante em questão. Muitos são favoráveis ao mata-mata, pelos mais diversos motivos possíveis. Nenhum dos que eu ouvi ou li me convenceu. Ter de volta a emoção de jogos decisivos, em ida e volta? A Copa do Brasil está aí exatamente para isso e vários jogos do Brasileirão fornecem a dose necessária de emoção. Não foram poucos, desde 2003, que se transformaram em decisões antecipadas ou que carregaram um peso fundamental para o restante do campeonato. Sem falar nas disputas acirradas para as vagas na Libertadores ou contra o rebaixamento, que envolveram vários clubes nas rodadas finais.
 
E o público? Ele se desinteressa por jogos no meio do campeonato de pontos corridos? É menos frequente porque não tem mata-mata? Basta ver que a média geral de público do Brasileirão entre 1971 e 2002 é de 14.554 e a de 2003 a 2014 é 14.217 para perceber que a diferença não é tão grande assim. Se a gente levar em conta que os estádios usados entre as décadas de 1970 e 1990 cabiam mais gente do que atualmente, o número ainda tem mais significado. O Maracanã se cansou de receber jogos com mais de 120 mil pessoas, por exemplo. Hoje, a capacidade do estádio não chega a 80 mil.

A tão debatida questão do calendário também deve ser levada em conta em um eventual retorno do mata-mata. É justo com investidores, sócios-torcedores e profissionais envolvidos um ou dois meses fora de combate, como aconteceu várias vezes até 2002? Nesse prazo, aqueles que ficam de fora do mata-mata têm as atividades do ano encerradas antes daqueles que chegaram à fase decisiva. E o torcedor que não vai ao estádio e paga seu pacote de pay-per-view? Seu clube está fora e ele é obrigado a ver a decisão com os outros? E a grana que vem dos patrocinadores? Vai pensar dez vezes antes de renegociar o contrato. E tem mais: o jogador ainda vai ter contrato e seu clube vai continuar pagando o salário dele. Sem jogar. Sem estádio para dar renda ou visibilidade na TV. Nos pontos corridos, seu clube pode até fazer figuração, mas vai jogar todas as rodadas e, mesmo que não lute por nada, você sabe que o calendário está cheio e que seu time de coração estará em campo. E você vai ao estádio ou vai acompanhar na TV. 

E tem, claro, a questão da preparação de cada clube. Imagine que você demora 20 anos para estruturar um clube e, no mata-mata, o craque, o artilheiro ou o goleiro salvador do seu time está fora por uma contusão ou suspensão. E seu time, que liderou toda a competição, entra desfalcado e perde. Ou, mesmo completo, em um dia ruim, toma de três e não consegue tirar a desvantagem no jogo de volta. De nada adiantou ganhar 18 das 19 partidas que disputou antes. São situações que cabem em jogos de copas e o país hoje tem a Copa do Brasil.

Pergunta para o torcedor do Cruzeiro se ele acharia bom fazer uma semifinal com o quarto colocado do ano passado, o Corinthians. A diferença era de 11 pontos (80 a 69). Justo? Em 2013, o Cruzeiro fechou a temporada com 76. O Botafogo foi quarto com 61. Quinze pontos. Aí porque o Botafogo empatou um jogo e ganhou outro todo o trabalho de uma ou mais temporadas vai para o ralo? Isso se ninguém inventar disputa entre oito times. Para exemplificar, no ano passado, o Atlético-PR, oitavo, fechou a temporada com 54 pontos, 26 a menos que o Cruzeiro, eventual rival em uma quarta de final. Os jogos seriam emocionantes? Pode até ser. Mas vale?

Enfim, sou contra a volta do mata-mata. Sou a favor de valorizar a Copa do Brasil, de ampliar a quantidade de clubes participantes e tornar a competição ainda mais abrangente. Quanto ao Brasileirão, que ele ocupe toda a temporada, tome mais espaço dos estaduais, não bata datas com jogos da seleção brasileira, privilegie os finais de semana. E que todos joguem a mesma quantidade de jogos. Ida e volta. E que o melhor vença.

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